Todo assento é preferencial

Por Stephanie Hering

Quem nunca pegou um ônibus ou entrou no metrô e já se deparou com os dizeres: "Assento reservado para o uso de gestantes, mulheres portando bebês ou crianças de colo, idosos e deficientes físicos. Ausentes pessoas nessas condições, o uso é livre" ? Os chamados "assentos preferenciais" estão previstos em lei (10.012, 13/12/1985) em São Paulo e em inúmeras cidades do Brasil, entretanto, sabemos que nem todo mundo segue à risca essa lei e convivemos diariamente com situações de desrespeito.

O panfleto que tem circulado durante o mês de Abril de 2010 nos ônibus por São Paulo, certamente não é lido por algumas pessoas...

São apenas 7h15 numa manhã chuvosa na Av. Paulista e espero pelo ônibus para a faculdade. Embarco no  975A Brasilândia/Metrô Ana Rosa (por sinal, lotado como sempre) e me deparo com uma senhora de pé, enquanto os assentos reservados a ela estão ocupados por, entre outros, estudantes e pessoas jovens, que ouvem música alta com fone ouvido, dormem (ou fingem dormir, não se sabe ao certo) e olham para a janela como se o assunto em questão não lhes dissesse respeito. Nos assentos normais, certamente o pensamento de oferecer seu lugar para outro e ficar de pé num ônibus lotado está bem longe de cogitação.. Ao falar com o cobrador, Sr. Jorge José dos Santos, 58 anos, pergunto o que ele acha sobre a situação e ele responde: "Ah, fazer o que né, as pessoas não respeitam, a gente tem que pegar no pé pra dá lugar pra gente certa. Tem uns que reclamam, mas sabem que não tem moral nenhuma, tá na lei e tem mesmo que respeitar. A verdade é que ninguém pensa nos outros, só em si mesmo, até na hora de subir e não dar espaço pros outros entrarem."
Na volta para casa, a cena se repete, só que desta vez na linha verde do metrô, Vila Madalena/Sacomã. Ao parar em estações de integração como Paraíso ou Ana Rosa, o vagão tem seus lugares ocupados em poucos segundos, inclusive os de cor azul (ou cinza nos trens mais novos), por pessoas que não estão nas condições citadas na placa azul acima. Sentada em um dos lugares especiais, pergunto à uma jovem, Manoela Araújo, 19 anos, se ela sabe que está sentada em um assento preferencial e obtenho a seguinte resposta: "Sei sim. Mas não tem ninguém agora que precise sentar aqui, então não tem problema." Ela me conta que já passou por uma situação desagradável, na qual um idoso discutiu porque ela não se ofereceu para ele se sentar, sendo que estava no assento amarelo do ônibus. "Fiquei constrangida, não tinha mesmo visto ele. Se eu tivesse, claro que ia ter  saído pra ele sentar, mas estava distraída e não vi." 
É verdade que como na própria lei se diz, ausente nessas condições o uso é livre, contudo, o problema é ceder o lugar na hora que algum idoso, deficiente ou mulher com criança de colo entra no no trem. Preguiça, falta de respeito, distração... Existem diversas "desculpas" para isso, porém nenhuma justifica o ato. 

                                                                                                     Foto: Stephanie Hering

No último ônibus do dia, o 875C Lapa/Metrô Santa Cruz, mais uma situação de desrespeito: um senhor e uma senhora de pé, segurando nas barras de segurança, enquanto pessoas leêm livros, dormem e ignoram a visão ao seu redor. Decido entrevistar a senhora e pergunto se ela não se incomoda com a situação, e porque não pede para se sentar se possui direitos. Ikeda Nagawana, 63 anos, com um sorriso no rosto me diz então: "Ah bem, já tô acostumada. Eu sei que tenho o direito de sentar né, mas não gosto de ficar pedindo pra ninguém, ainda fico como a chata. Tem que partir da consciência de cada um..."
Pois a Sra. Ikeda estava certa... Deve partir da consciência de cada um, que antes de assentos amarelos, azuis ou cinzas, TODO assento é preferencial e um dia, também gostaremos de poder usufruir não de privilégios (como alguns pensam), mas de direitos básicos de quem também faz parte da sociedade, não importa idade, deficiência ou outros fatores.

                                                                         Foto: Stephanie Hering

Enquanto o senhor fica de pé no ônibus 875C...

                                                                                                     Foto: Stephanie Hering

...Pessoas usufruem do "descanso" nos assentos preferenciais ao lado do cobrador.